
Realmente nao sei o que dizer, nao sei o que fazer.
Quando crianca, costumava prestar muita atencao ao trajecto que fazia de carro. Ora para ir a uma festa de familia; Mussulo; Panguila; Ilha; ora para ir a Maravilha. Uma lembranca muito forte que tenho dessa epoca e o olhar de admiracao das criancas na rua. Olhavam-me como se fosse uma princesa europeia desfilando dentro do seu carro refrigerado, com vidros automaticos, cabelos perfeitamente penteados, usando roupa bonita.
Por conseguinte, sentia-me suja, ma... fria como uma usurpadora. A tristeza patente naqueles olhares invadiam-me a alma e arremessavam-me para as profundezas da Terra. A estupefaccao e curiosidade delas por algo nunca antes presenciado esbofetiava-me a cara, o pingente de ouro impingia-me mil dores.
Percebi que algo muito mau acontecia ao meu redor. Mas eram todos tao felizes! O mussulo era musical, o almoco era sempre rico! Sempre tinha alguma festa. As pessoas viajam, parentes viviam fora... o que era aquilo que via na rua? O que eram aquelas criancas sujas, famintas, pedintes, amputadas, na rua?! Aquelas mulheres chorosas, com seus bebes as costas, com bacias nas cabecas a gritar os seus lamentos?! Porque tinha sempre gente no portao a pedir por alimento?!
Hipocrisia e uma doenca que se instala lentamente, silenciosamente. Ela penetra em nosso coracao e se acomoda... se aloja, e entranha. Nos envolve, adorna... poe sorrisos vazios em nossos labios e nuvens brancas em nossas iris. Pensamentos programados, sentimentos irreais, surreais... e assim vamos esquecendo a arbitrariedade.
Nenhum comentário:
Postar um comentário