domingo, 22 de abril de 2012

A máquina fotográfica




Helena acordava agora da anestesia. Seu parto havia tido complicações de última hora e portanto teve que ser submetida a uma cesariana.Sentiu seu corpo doer de forma abismal, o ventre estava extremamente pesado e os seios latejavam de tão inchados que estavam por estarem cheios de leite para amamentar sua cria.

 Sofia era pequena, linda. Chegou com o lacinho rosa que haviam comprado para aquele momento e vestida com a roupinha de crochê feita por sua avó paterna. Bocejava angelicalmente e contorcia os dedinhos enrugados que não sabia ainda controlar. Foi à ela entregue, a sua progenitora.

 Helena não soube frear esta emoção, não soube sequer analisá-la, limitou-se a senti-la. Uma forte e incomensurável repulsa a invadiu, teve náuseas e horror por aquela criatura que se encontrava em seus braços, que havia saído de dentro de si e que agora instintiva e cegamente procurava o bico do seu seio para se alimentar. Seu desespero foi avassalador. Suas mãos passaram a tremer e a suar, sua boca criou mil e uma rugas à sua volta e seu cenho franziu sorumbaticamente. Quis fugir daquele ser que repudiava grotescamente.

 Neste instante, Gilberto entrou no quarto, trazia um cesto de flores, balões e uma máquina fotográfica. Odiou-o profundamente, sentiu nojo e desprezo por aquele bondoso e trabalhador homem que era o seu marido. A felicidade resplandecente patente em seus olhos foram o golpe final para que a repulsa por ele se instalasse definitivamente em seu âmago.

 Helena pediu a Deus para morrer, lembrou também de seus sonhos de menina, de suas aspirações e desejos. Por fim, sentiu um consternador remorso, estava condenada. Pôs-se a chorar e Gilberto soube captar, prontamente, o momento de suas lágrimas com a sua máquina fotográfica.

quarta-feira, 18 de abril de 2012

Nós e os outros



Nascemos, e em condições normais, seremos amados e educados por nossos progenitores. Aprendemos a experienciar a vida, a codificar percepções e a formular as nossas próprias ideias através desta complexa simbiose.

Porém, pessoalmente assumo as diferenças que nos caracterizam e individualizam como o grande motor de nosso primeiro fatal destino. Digo primeiro porque acredito que o livre arbítrio que gozamos seja poderoso o bastante para que possamos alterar a marcha desenfreada da nossa realidade aparentemente inquebrável.

A felicidade exige competência. Muitos de nós, os humanos, fazemos uso do rico leque de contrariedades que nos desencaminham do bem comum. A falta de apoio moral, de incentivo ao desenvolvimento pessoal e intelectual advindos dos reveses da vida são tidos como determinantes e assim sofremos.Coragem faz parte dos requisitos básicos.

Que os momentos de máxima solidão sirvam como análise. Que nossas falhas nos chamem à realidade do mundo, que o orgulho não nos limite. Que saibamos perder. É também necessário compreender que a felicidade é como nós, única. Portanto comparações sempre nos conduzirão ao erro.

A superficialidade do pensamento só nos permitirá experimentar a vida desta forma, na superfície. Assim corremos o risco de realmente nunca ter sentido a vida na realidade.

Por fim, um exercício diário. E se nós fôssemos o outro?
Este texto não é de minha autoria, porém achei por bem partilhar convosco.




INDICAÇÕES PARA COMBATER A TRISTEZA E MANTER A ALTIVEZ
DA ALMA EM TODA A SUA VIRTUDE

"Aquele que deseja as coisas que são passageiras pode
ser considerado um homem infeliz, ao passo que aquele
cuja vontade se cumpre é um homem feliz."

"Aspirar a felicidade e nos guardar de sermos
desgraçados é possível se fazemos com que nossa
vontade e aquilo que desejamos estejam além daquilo
que nos chega pelo mundo sensível, mutante e instável
e também, se não nos entristecemos com aquilo que nos
escapa do mundo sensível."

"Se não existe o que queremos, devemos querer o que
existe e não preferir a persistência da tristeza no
lugar da persistência da alegria."

"A quem se entristece com a perda das coisas que se
perdem assim como com a necessidade das coisas que se
necessita, a este jamais desaparecerá a tristeza
porque, em todas as situações da vida, perderá objetos
amados e se-lhe escapará aquilo que busca."

"Visto que a alegria e a tristeza não podem coexistir
no mesmo instante na alma, devemos fazer com que
nossas almas estejam satisfeitas em todas as
circunstâncias mediante uma condução correta que
proporcionamos a ela."

"E nessa senda devemos conduzir nossa alma aos
costumes excelentes e acostumá-la a isso até que
forjemos um caráter que torne a vida agradável durante
o tempo de nossa existência."

"Como não podemos nos manter totalmente isentos de
estarmos tristes e como faz parte da natureza
tropeçarmos na tristeza, devemos ao menos ter cuidado
em reduzir o tempo em que ela dura em nós."

"Se realmente houvesse um motivo para nos
entristecermos este deveria ser o da separação de
nosso verdadeiro lugar e de nossa verdadeira pátria,
onde não há carências nem desgraças, nem perdas nem
coisas inalcançáveis"